quinta-feira, fevereiro 13

UM CADÁVER NA COZINHA - CAPÍTULO 8


CAMINHO DE VOLTA

     Durval sempre se perguntava por que deixava escurecer para ir embora da casa de Botelho. Sabia que as estradas de terra ficavam intransitáveis quando chovia, e naquele lugar sempre chovia. Eram quase dez horas da noite quando o caseiro manco abriu o portão, em meio à garoa fina, e Durval saiu do sítio “Quinta da Neblina” com seu Corcel vermelho 78.
       A mulher de Botelho havia sido gentil em insistir para que ele jantasse antes de ir embora. Durval não conseguia resistir ao seu delicioso macarrão de forno com queijo derretido. Mas o preço pela saborosa refeição era descer os quilômetros de estrada de terra até a cidade em meio a uma chuva que ficava cada vez mais forte.
       Pelo menos confirmou que a mancha encontrada no tapete da sala era sangue mesmo. Mas isso ainda não esclarecia muita coisa. Primeiro: Quem tirou o cadáver da cozinha sem que ninguém visse? Segundo: De quem era a pegada no tapete? De acordo com Botelho a marca era de um sapato de salto alto. Uma mulher a assassina. Mas como ela havia entrado na sala da casa sem que percebessem.
       Os limpadores do para-brisa estavam ligados na velocidade máxima, mas ficava cada vez mais difícil enxergar a estrada. A descida era íngreme e cheia de curvas. De um lado, uma parede de terra, e do outro, um barranco; lá embaixo a cidade iluminada. Durval descia lentamente em primeira marcha, não queria despencar barranco abaixo. Com cuidado, procurava desviar das poças de água, ficar atolado naquele lugar não seria nada conveniente.
       Os vidros estavam embaçados pelo lado de dentro. Durval pegou a flanela laranja no porta luvas e limpou. Parecia que quanto mais limpava, pior ficava. Abriu um pouco a janela na esperança de desembaçar os vidros. Só então percebeu que havia um carro atrás dele. Os faróis altos ligados.
       Durval diminuiu a velocidade e deu passagem, aproximando-se do paredão de terra à esquerda. Mas o carro não ultrapassou. Será que estava com medo de cair no barranco?, pensou Durval, e aproximou o Corcel ainda mais do paredão. Havia espaço suficiente para ultrapassar, mas o carro acelerou e bateu violentamente na traseira do Corcel, fazendo-o derrapar na estrada enlameada. O coração de Durval, que já havia sofrido dois enfartes, começou a bater forte no peito. Como reflexo, ele aumentou a velocidade do Corcel. Mas o carro atrás fez o mesmo.
       O barulho da chuva na capota se misturava ao som alto do motor do carro de trás com suas aceleradas forçadas e arremetidas na direção do Corcel. Mais à frente havia uma curva fechada para a esquerda. Pouco antes de Durval conseguir fazer a curva, o carro bateu de novo na traseira do Corcel. Durval manobrou para a esquerda e os dois carros ficaram emparelhados. Não era possível ver direito por causa da chuva e da escuridão, mas o carro era mais alto que o Corcel, talvez uma camioneta. Do lado direito, a borda do barranco dava vertigem, seria uma queda longa. E então o carro bateu com força na lateral do Corcel, empurrando-o para o barranco. Durval percebeu o momento exato em que a roda da frente perdeu a aderência com a estrada.


CONTINUA...


Um Cadáver na Cozinha é um folhetim escrito por José Gaspar e publicado na coluna "Histórias de Mistério" do jornal The Brazilians em Nova York.

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